A invasão por Acacia é facilitada pela permeabilidade da paisagem: O papel da degradação de habitat e da rede rodoviária

Preparado por Gustavo Heringer, Jan Thiele, Cibele H. Amaral, João A. A. Meira-Neto, Fabio A. R. Matos, Jan R. K. Lehmann, Tillmann K. Buttschardt & Andreza V. Neri

Ecossistema de Mussununga do tipo savana arenosa rodeada por Mata Atlântica (esquerda) e Acacia mangium no ecossistema de Mussununga (direita).

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Degradação de habitat e invasão biológica estão listadas entre as principais ameaças à biodiversidade. A Mata Atlântica brasileira, um dos hotspots globais de biodiversidade, é fortemente impactada pela fragmentação devido à conversão de ecossistemas naturais em áreas para uso humano (por exemplo, terras para agricultura e florestas madeireiras). A fragmentação causa diminuição na riqueza de plantas, mudança na comunidade vegetal e perda de estoque de carbono nos fragmentos remanescentes. Ao mesmo tempo, a conversão de ecossistemas naturais aumenta a disponibilidade de habitat para espécies invasoras adaptadas a distúrbios, como Acacia auriculiformis e Acacia mangium (a partir de agora, espécies de Acacia) introduzidas em todo mundo – além da distribuição natural na Australásia. Ainda, beira de estradas fornecem habitat para invasão de espécies de Acacia e podem funcionar como corredores de dispersão que facilitam a invasão dessas espécies em ecossistemas naturais.

Portanto, nós investigamos se a fragmentação da Mata Atlântica e a rede rodoviária aumentam a permeabilidade da paisagem para invasão biológica por espécies de Acacia em ecossistemas de Mussununga. Nós investigamos especificamente (a) se a permeabilidade da paisagem facilita a invasão biológica por espécies de Acacia; (b) se de fato fragmentos de floresta são uma barreira para espécies de Acacia, enquanto redes rodoviárias servem como corredores; e (c) se as Mussunungas por si têm algum papel na invasão biológica. A permeabilidade da paisagem foi medida como a condutância efetiva da paisagem para um objeto que se desloca aleatoriamente (random walker). Em outras palavras, a condutância efetiva aumenta com o aumento da disponibilidade de caminhos para dispersão (por exemplo, redes rodoviárias). Estudar como a paisagem afeta a ocorrência de espécies de Acacia na Mussununga é importante uma vez que esse ecossistema de savana-arenosa inserido na Mata Atlântica é caracterizado por solos ácidos e pobres em nutrientes (figura acima) e já sofre os impactos da invasão biológica. Por exemplo, a invasão por espécies de Acacia está associada com o aumento da altura da vegetação, diminuição da abundância de espécies nativas e morte de espécies arbóreas na Mussununga (Heringer et al. 2019).

Nós observamos que a probabilidade de invasão por espécies de Acacia aumenta significativamente com o aumento da permeabilidade da paisagem. Além disso, a permeabilidade da paisagem foi melhor representada quando consideramos os fragmentos de floresta e superfícies aquáticas como barreiras e redes rodoviárias como corredores. Esses resultados reforçam que a Mata Atlântica, caracterizada por árvores altas (cerca de 30m), atua como uma barreira, enquanto a degradação de habitat e o distúrbio associado às estradas e rodovias favorecem o espalhamento de espécies de Acacia na paisagem. Também encontramos que o tamanho da Mussununga teve um efeito negativo na invasão biológica. Portanto, podemos concluir que a extensiva degradação de habitat e a densa rede rodoviária facilita a invasão por espécies de Acacia nos ecossistemas de Mussununga, particularmente nas Mussunungas menores. A permeabilidade da paisagem pode ser usada para predizer quais manchas de Mussununga estão sob alto risco de invasão biológica por espécies de Acacia. Além disso, nós propomos que a conservação e restauração de florestas no entorno das Mussunungas é uma ação efetiva para prevenir que as sementes de espécies de  Acacia atinjam as manchas de Mussununga. Tais ações são muito relevantes considerando que o ecossistema de Mussununga não é explicitamente preservada pelas principais leis brasileiras de proteção à vegetação nativa.

Referência

  • Heringer, G., Thiele, J., Meira-Neto, J.A.A. and Neri, A.V. (2019) Biological invasion threatens the sandy-savanna mussununga ecosystem in the Brazilian Atlantic Forest. Biological Invasions, 21, 2045–2057. https://doi.org/10.1007/s10530-019-01955-5

Esse é um resumo em linguagem simples do artigo de Heringer et al. publicado na Applied Vegetation Science (https://doi.org/10.1111/avsc.12520).